Era uma vez um pão que vivia revoltado. Sentia-se moído
desde o primeiro grão e amassado desde o primeiro dia. Detestava que o
confundissem com os outros pães e que dissessem que era da mesma fornada. Não
conseguia impedir algumas migalhas de raiva quando diziam que era tudo farinha
do mesmo saco. Não. Ele não tinha nascido para pão de forma. Era inconformado.
Sabia de que massa era feito. Sentia uma facada
sempre que ouvia perguntar se era fresco. Era o pão de cada dia. Mas depois lá
acalmava. Tinha a côdea dura, mas o miolo era mole. Uma certa altura, farto de
ser pão para toda a colher, decidiu fugir com um queijo tradicional. Pão pão, queijo
queijo. A relação não durou muito tempo, o queijo amanteigou-se com uma broa. A
tradição já não é o que era. Dizem as más-línguas e as boas bocas que, perante
tal desilusão, entrou num convento e se tornou num devoto pão de Deus.
07 fevereiro 2020
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